PROVIDÊNCIA
DIVINA
Conto
Assim como ocorre
em outras partes do mundo, as pessoas vivem divididas em classes sociais
conforme suas condições de vida, preparo cultural, econômico, moral, de tal
sorte que uns vivem na luxuria usufruindo de tudo que desejam para satisfazer
suas vontades, outros se contentando com o necessário para a sobrevivência e
uma grande parte restante vivendo na mais profunda pobreza não tendo sequer
alguns o que comer diariamente.
Um
desses exemplos tristes de vida humana
foi a do Thiago, cidadão humilde, sem recursos de qualquer natureza, emprego,
instrução escolar totalmente deficiente,
parentes que lhe desse uma ajuda, qualquer que fosse e que vivia seus
dias das coisas que encontrava pelo caminho ou de algum alimento que alguém por
caridade lhe fornecia no dia-a-dia.
Por
não ter residência fixa, um dia dormia num canto, outro dia em outro, pelos
becos, bancos, porta de igrejas, etc.
Como
vivia numa cidade litorânea, as vezes dormia pelas praias, principalmente
quando fosse uma noite de clima quente e que não requeresse uso de cobertas e
tapumes para lhe proteger do frio. Seus bens se resumiam num velho saco de pano que carregava consigo
por toda parte, onde guardava uma
pequena caneca de plástico, duas camisas e uma calça todas usadas, que havia
ganho de alguém e um surrado cobertor desses bem simples, que lhe cobria o
corpo nas noites de frio.
Numa
dessas noites quentes de céu límpido e estrelado estava ele no canto de uma
escura e deserta praia, já tarde da noite, sentado em uma grande pedra que
havia na praia, com os cotovelos escorados nos joelhos e as mãos espalmadas em
ambas as faces, apreciando a imensidão do mar com suas ondas a esborralhar-se
pela praia afora, pensativo e lamentando a vida que levava neste mundo, indagando
a Deus porque tudo tinha que ser assim para ele.
Era
uma bela noite de lua cheia e esta com seus raios brilhantes iluminava o
horizonte pintado nas águas do oceano uma
coloração prateada pelos belos efeitos sobre as ondas que se formavam seguidamente umas
após as outras .
Nesta
postura e momento de lamentação, seus olhos observaram que na areia da praia toda
vez que uma onda se quebrava por
toda sua extensão e retornava para o mar, aparecia um objeto muito brilhante de forma circular, que tinha mais ou menos uns oito centímetros
de diâmetro o qual resplandecia aos sues olhos, devido à intensidade do
brilho. Tal brilho lhe despertou a curiosidade. O que seria aquele objeto,
talvez uma estrela do mar, mas uma estrela do mar não produziria tal brilho,
não seria também um peixe, pois era de forma acentuadamente cilíndrica, talvez
uma lata, ou um caco de vidro.
Por
muito tempo ficou ali a visualizar tal objeto e o brilho parecia cada vez mais
lhe ofuscar os olhos, até que inconformado e curioso e também um tanto
cauteloso, pois tinha muito medo de que fosse algum animal aquático que lhe
pudesse picar alguma parte do corpo, mesmo porque muito pouco adentrava as
águas do mar, pois receava em muito ser vitima de algum animal marinho,
principalmente tubarões ferozes dos quais sempre ouvia comentários que lhes
causavam espanto, bem como sua falta de habilidade no nado.
Porém,
sua curiosidade lhe venceu o ímpeto, levantando-se e caminhando cautelosamente
em direção ao objeto e quanto mais se aproximava do mesmo seu brilho mais se acentuava, até se aproximar
totalmente e verificar que se tratava de uma estrela idêntica a uma estrela do
mar, porém muito brilhante, cujo brilho acentuado pela luz intensa da lua, lhe
ofuscava as vistas. O que pode ser isto pensou,
será um ser vivo do qual desconhecia e pouco a pouco foi aproximando a
ponta do pé direito na coisa chegando a tocar-lhe com o dedão e esta nem se
mexeu. Repetiu o gesto por várias vezes e notou que tal objeto ou coisa não lhe
causaria mal algum. Então se abaixando tomou-a em suas mãos e
pode constatar tratar-se de um tipo de estrela de formação calcárea, toda
incrustada de pedras transparentes que brilhavam intensamente. Era realmente
uma peça rara e de uma beleza inigualável da qual nunca em sua vida ouvira
falar ou saber de sua existência.
Com
aquela peça em mãos, saiu a perambular pela praia escura apenas sob o clarão da
lua intensa, pensando agoniado o que fazer com aquele achado, mostrar para
alguma pessoa, e se fosse uma peça de grande valor, alguém poderia ludibriá-lo
e tomar-lhe a estrela, o que fazer.
Com
todos aqueles pensamentos e indagações acabou passando a noite toda acordado,
já clareava o dia e ele ainda pensava em quem confiar sua descoberta.
Cansado
por ter passado a noite toda às claras, sentou-se numa mureta que circundava a
praia, com os pés descalços a escavar a areia e o olhar esparramado no
horizonte onde as águas do mar tocavam as nuvens, quando repentinamente um
senhor de cabelos esbranquiçados, cuja
idade ultrapassava os cinqüenta anos, sentou-se ao seu lado, cumprimentando-lhe
e desejando bom dia e respondendo a delicadeza do homem voltou-se para este e
pôs-se a observá-lo cuidadosamente e a sua conversa para certificar-se não se
tratar de um pilantra qualquer que sobre si quisesse tirar alguma vantagem de
sua humildade e bondade.
Thiago
era realmente a despeito de sua posição social um ser desprovido de
maldade respeitava a todos com muito
carinho.
Após conversarem por bom tempo e sentir a lealdade daquele
senhor, Thiago resolveu indagar o estranho, dizendo-lhe:
- Como é mesmo seu nome senhor ?,
respondido-lhe o estranho:
- Meu nome
é Gabriel.
- Eu gostaria de perguntar uma coisa para o
senhor -
se uma pessoa chegasse para o
senhor e lhe apresentasse um objeto interessante e lhe perguntasse se o senhor
já havia visto tal tipo de objeto e se o
mesmo tinha algum valor o que o senhor faria, como agiria com essa pessoa?
Sem
querer saber o motivo de tal pergunta, imediatamente o senhor Gabriel lhe
respondeu:
– Senhor Thiago, uma coisa todo homem tem que
cultuar consigo, nunca desejar mal ao próximo e se não puder ajudar, que não
atrapalhe, nem prejudique seu semelhante, a maldade somente ocasiona desgraça
para os homens e entre estes.
Sentido
um certo grau de sinceridade naquele cidadão e confiante de que aquele bom
homem pudesse ajudar-lhe a solucionar o problema, apresentou ao mesmo a estrela
que encontrara na praia na noite passada, explicar-lhe o acontecido e
perguntando-lhe:
-
Senhor Gabriel o senhor conhece ou já viu alguma vez um objeto igual a esse?
-
Hó senhor Thiago é uma linda peça e eu nunca vi alguma coisa igual, para mim
parece tratar-se de uma jóia rara de aspecto inigualável e que deve valer muito
dinheiro, precisa ser avaliada por uma pessoa entendida nessa área, um
joalheiro, eu acredito até que essas
pedras transparentes e de muito brilho, parecem tratar-se de brilhantes
de alto quilate.
-
Mas como vou fazer se não conheço nenhuma pessoa com esse gabarito?
-
Se o senhor quiser confiar, poderemos ir juntos a um joalheiro muito honesto,
chamado Ananias, meu conhecido, no qual eu confio, com certeza ele ira lhe
ajudar e o senhor terá uma boa
resposta para solução de suas duvidas.
O
sol já estava alto com seus raios escaldantes
e lá se foram os dois consultar o tal joalheiro, senhor Ananias.
Chegando
a joalheiria, o senhor Gabriel foi logo apresentando o Thiago ao Ananias, e mostrando-lhe a estrela pediu para
que avaliasse aquela peça e lhe dissesse o quanto poderia ser seu valor.
Tomando
a peça em suas mãos, o senhor Ananias enrubesceu as faces e espantado disse:
-
Isto é uma jóia de muito valor, a primeira vista estas pedras são brilhantes
puros, e examinando mais a fundo a estrela, realmente se convenceu tratar-se de
uma jóia de grande valor, cuja estimativa ultrapassaria quinhentos mil reais.
- E como eu poderia
vender essa jóia senhor Ananias, o senhor faria isso para mim?
- É claro que eu venderia para o senhor, apenas descontaria
uma pequena importância relativa ao meu trabalho e o restante passaria para o
senhor tão logo a vendesse. Não é muito fácil tal empreitada, pois depende de
aparecer uma pessoa com condições e que
possa desembolsar tal quantia, mas por ser uma jóia muito rara e bonita tenho
certeza que não demorará muito tempo para ser vendida. Somente uma pergunta – essa jóia é mesmo do
senhor não é?
Respondendo
o Thiago:
-
Sim senhor Ananias certamente é de minha propriedade, mas não lhe revelando os
detalhes de seu achado.
Então fique com a estrela sob vossa
responsabilidade e veja se consegue vende-la para mim.
Muito bem então eu vou lhe fazer
um pequeno recibo da estrela e procurarei
comercia-la o mais prevê possível, pois entendo que o senhor realmente
necessita desse dinheiro da venda não é mesmo?
E
lá se foi para sua rotina o humilde Thiago.
Tal
era a sorte que parecia rondar o caminho
de Thiago, que não demorou um dia de espera para que o senhor Ananias saísse a
sua procura, pois no mesmo dia que deixara a estrela para que a mesma pudesse
supostamente ser comercializada, esta fora vendida a um grande colecionador de jóias que na loja do
senhor Ananias havia passado por acaso.
Com
toda sua habilidade de bom comerciante, o senhor Ananias deveras, alcançou a cifra
de oitocentos mil reais, tamanha era a beleza e pureza dos diamantes que havia
na jóia.
Após
perguntar para um e para outro, das pessoas que pareciam conhecer o Thiago,
sobre seu paradeiro, conseguiu
localiza-lo sentado na mesma mureta da praia, exatamente no local onde
encontrara a estrela.
-
Senhor Thiago, senhor Thiago, o senhor esta mesmo com sorte, acabei de vender
sua estrela para uma pessoa que se interessou muito pela sua beleza e que acabou me pagando a importância que lhe
pedi, ou seja, bem acima do que lhe falei, alcancei oitocentos mil reais e tal
importância está toda aqui comigo e
quero lhe passar neste momento.
Foi
um espanto para o Thiago, pois nunca em sua vida vira tanto dinheiro, de tal
sorte que não sabia se chorava, abraçava o senhor Ananias, ou se corresse a
procura do senhor Gabriel seu fiel amigo
e atônito, começou a derramar lágrimas de emoção, ajoelhando-se ao chão
agradecendo em prantos a Deus aquele feliz momento.
-
Senhor Ananias, quero que retire desse total sua porcentagem pela venda, o que
o senhor retirar para mim estará muito bom.
-
Está bem senhor Thiago, para satisfazer
meu trabalho vou retirar apenas o correspondente a dois por cento do total da venda e o senhor ficará
então com setecentos e oitenta e quatro mil reais, está bom assim ?.
-
Claro que está senhor Ananias, o senhor foi para mim um santo me ajudando dessa
maneira, não sei como lhe agradecer tal empreitada.
-
Não precisa me agradecer, peço apenas que o senhor tome muito cuidado com todo
esse dinheiro e que seja muito feliz no seu aproveitamento, pois vejo que na
realidade o senhor necessita e muito de acertar sua vida, eu estarei sempre a
disposição e abraçando o Thiago despediu-se partindo para sua loja.
- Hó meu Deus! Que farei com todo esse dinheiro, me ilumine o
pensamento para começar a gasta-lo da melhor forma possível, bem como guarda-lo
em um lugar seguro, e estava lá muito pensativo, quando sem que percebesse
lhe aparece à frente novamente o bom senhor
Gabriel.
- O que está ai pensativo caro
Thiago.
- Senhor Gabriel, meu amigo, o
senhor acredita que o senhor Ananias conseguiu vender minha estrela e já me
entregou o dinheiro, está todo aqui e eu não sei como vou administra-lo agora.
-
Tenha calma Thiago, se você quiser eu poderei ajuda-lo dando-lhe algumas idéias
que na certa vão lhe ajudar na solução dessa sua dificuldade.
-
Antes de tudo senhor Gabriel, quero lhe recompensar com parte deste dinheiro,
pois se não fosse o senhor não sei o que poderia ter acontecido com a minha
estrela.
-
Thiago você não me deve nada o que eu
fiz foi por pura amizade e carinho e se
vou continuar a te ajudar será pelo
mesmo motivo, nada quero de você, somente que tenhas muitas felicidades daqui
para frente.
- Então como faremos ?.
- Primeiramente vamos até a um banco conhecido para depositar com
segurança todo esse dinheiro vamos abrir uma conta em seu nome. Por ser uma
quantia grande, dará para acertar totalmente sua vida daqui para frente e ainda
para que possas levar uma vida mais descente e feliz em todos os aspectos. Depois
vamos ver outras coisas necessárias, tudo por etapas.
Tendo
aberto uma conta num importante banco do local, Gabriel sugeriu ao Thiago a
compra de uma casa nas proximidades em que vivia a perambular ou talves em
outra localidade, porém que fosse cômoda e que pudesse doravante fixar sua moradia, cujo ato se concretizou em pouco tempo de negociação na
qual tomou posse rapidamente. Faltavam os móveis e utensílios os quais também
tranqüilamente foram providenciados. E assim, Thiago se instalou
confortavelmente na nova casa.
Os dias foram se passando e em todos os
instantes dessa nova vida lá estava sempre o bom Gabriel a lhe orientar e
ajudar no acerto das coisas e de toda sua vida particular.
A
cada dia que passava mais se transformava em outro homem, já não mais se
lembrava dos dias angustiantes vividos antes de seu encontro com a bela
estrela, fome, frio, discriminação. Era realmente uma nova vida.
Um
fator muito importante acompanhava o Thiago que era sua grande simplicidade,
seu amor à vida e às pessoas, e seus pensamentos de poder de alguma forma ajudar outras pessoas
que como ele não tiveram a mesma sorte e
que viviam a mercê do destino sofrendo pela natureza afora.
Alguns
anos se passaram do seu grande achado, seu progresso de vida era acentuado,
sempre com a inestimável ajuda do bom Gabriel, tendo se dedicado ferrenhamente
aos estudos, chegando a concluir o nível médio de ensino e já se preparava para ingressar numa
Universidade.
Vivendo
num bom equilíbrio de vida, sentiu a necessidade de constituir uma
família, mulher e filhos.
Apesar
de ter sofrido muito na vida, Thiago tinha bons traços fisiológicos e como já
andava a essas alturas sempre bem vestido e com boa apresentação não foi muito
difícil conseguir se encantar por uma
bela moça, a Maria de Lourdes, que lhe devotando carinho e simpatia o aceitando
e em pouco tempo se casaram indo viver juntos na casa que havia conseguido
comprar.
Suas
economias, ao invés de diminuir, cada vez mais eram acrescidas de juros pelas aplicações
que aprendera a fazer com o grande amigo.
Por
ter tido uma vida humilde e simples, Thiago nada sabia fazer em termos de
produtividade, mas havia a necessidade de fazer algo, um trabalho, e por dispor
de condições econômicas, o Gabriel lhe sugeriu a abertura de um estabelecimento
comercial, mas o que seria interessante começar?. A concretização da idéia culminou com a
instalação de uma boa e bem montada padaria a qual passou atender toda vizinhança e em pouco tempo quase já nem
dava conta do trabalho, a tal ponto que ele e a mulher administravam o
estabelecimento e alguns funcionários tocavam todo o serviço além de darem um
especial atendimento a toda clientela.
Seguindo
sua idéia de caridade e considerando a boa produção de sua padaria, passou a
separar uma parte dos pães produzidos, doando-os diariamente para uma
instituição de amparo a idosos da região em que morava, doação essa que era
também por ele acrescida de igual quantidade de leite para que pudessem os
velhinhos ali internados, receberem
sempre o seu cafezinho da manha. Para ele o motivo de grande felicidade era ao
visitar de vez em quando a Instituição, ver aqueles idosos contentes se alimentando dos pães e leite que para ali
mandava todos os dias.
Contava dois anos de seu casamento com Maria de Lourdes, quando
com muito carinho, receberam a vinda do primeiro filho, o belo e robusto
Messias que viria realmente coroar toda sua felicidade, cujo nome lhe fora dado
devido sua grande crença em Jesus Cristo.
Para
culminar essa real história de sua vida, impôs ao senhor Gabriel a
obrigatoriedade de ser o padrinho de seu filho, como eterna gratidão por tudo
que este fizera para ele, sem querer a qualquer tempo alguma retribuição por
sua ajuda, dessa forma estariam amarrados para sempre com laços de grande
fraternidade.
E
assim, todos viveram felizes por muitos e muitos anos.
Silvio Ribeiro
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